"(…)Claro que você não tem culpa, coração, caímos exatamente na mesma
ratoeira, a única diferença é que você pensa que pode escapar, e eu
quero chafurdar na dor deste ferro enfiado fundo na minha garganta seca
que só umedece com vodka, me passa o cigarro, não, não estou
desesperada, não mais do que sempre estive, nothing special, baby, não
estou louca nem bêbada, estou é lúcida pra caralho e sei claramente que
não tenho nenhuma saída, ah não se preocupe, meu bem, depois que você
sair tomo banho frio, leite quente com mel de eucalipto, gin-seng e
lexotan,depois deito, depois durmo, depois acordo e passo uma semana a
ban-chá e arroz integral, absolutamente santa, absolutamente pura,
absolutamente limpa, depois tomo outro porre, cheiro cinco gramas, bato o
carro numa esquina ou ligo para o CVV às quatro da madrugada e alugo a
cabeça dum panaca qualquer choramingando coisas do tipo
preciso-tanto-de-uma-razão-para-viver-e-sei-que-esta-razão-só-está-dentro-de-mim-bababá-bababá,
até o sol pintar atrás daqueles edifícios, não vou tomar nenhuma medida
drástica, a não ser continuar, tem coisa mais destrutiva que insistir
sem fé nenhuma?"
— (Caio Fernando Abreu)
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